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segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Forças Armadas: Uma questão de soberania nacional

Forças Armadas: Uma questão de soberania nacional
11/11/2007 - 16h44
Marcelo Rech

Na semana passada, o Comandante do Exército, General Enzo Martins Peri e o ministro da Defesa, Nelson Jobim, fizeram questão de destacar que o Brasil não se preocupa com as compras militares da Venezuela e que os programas de reaparelhamento das Forças Armadas (que Jobim fez questão de frisar como de “aparelhamento”) devem levar em conta apenas os interesses e objetivos do Brasil.

No entanto, após sete audiências públicas no Congresso Nacional, onde cada comandante compareceu duas vezes (Câmara e Senado. O ministro Jobim esteve apenas na Câmara), pairam muitas dúvidas sobre as reais pretensões militares do Brasil.

Para vários analistas internacionais, o Brasil está se armando por conta das ameaças que vêm do Norte, da Venezuela e a América Latina estaria definitivamente numa corrida armamentista.

No encerramento do VII Encontro Nacional de Estudos Estratégicos, promovido pelo Gabinete de Segurança Institucional, realizado em Brasília na semana passada, Nelson Jobim e o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, defenderam a modernização das Forças Armadas do Brasil e lembraram que o país tem ambições externas que vão exigir forças capacitadas, operacionais e em condições de defender os interesses do país interna e externamente.

Queiram ou não, o rearmamento da Venezuela despertou os militares brasileiros e contagiou o governo para que a retórica em torno da modernização das Forças Armadas fosse abandonada.

Nelson Jobim tem dito que o Brasil precisa recuperar sua capacidade disuassória. Ele disse ao final do VII ENEE que “aqueles que entrarem no espaço aéreo ou no mar jurisdicional brasileiro, terá problemas”.

Especula-se que o orçamento das Forças Armadas poderia ser aumentado em até 50% para 2008, passando de US$ 6,9 bilhões para US$ 9,1 bilhões.

Outros R$ 1 bilhão ao longo dos próximos oito anos estariam garantidos para a conclusão do submarino nuclear. Algo como R$ 130 milhões por ano é o que a Marinha considera necessários para o projeto.

De acordo com os comandantes das três forças, que relataram a situação de penúria que enfrentam, o país teria de injetar cerca de R$ 16 bilhões até 2021 para que as Forças Armadas tenham condições de cumprir com o paple de dusuassão.

Além disso, os militares com o apoio dos ministros Roberto Mangabeira Unger e Nelson Jobim, querem que a indústria nacional tenha como fornecer os equipamentos necessários para as Forças Armadas.

Os ministros defendem mudanças na lei de licitações para que as empresas nacionais sejam estimuladas a produzir para o mercado interno (para as três forças) e externo (países vizinhos).

Jobim, por exemplo, prefere pagar mais caro às empresas brasileiras, pois sabe que poucos países estão dispostos a transferir tecnologia num campo tão sensível quanto crítico. Na avaliação de Nelson Jobim, o Plano Estratégico da Defesa que deve ser apresentado em setembro de 2008, vai vincular a defesa nacional com o desenvolvimento industrial.

O contexto regional

Já não restam dúvidas que a geopolítica regional despertou o Brasil para a recuperação das suas Forças Armadas.

Nesse contexto, os avanços do presidente venezuelano Hugo Chávez sob os países vizinhos e centro-americanos precisa ser monitorado, pois o próprio presidente da Venezuela já afirmou que não descarta intervir na Bolívia se o presidente Evo Morales for ameaçado.

No Congresso, os comandantes desnudaram a situação de cada força. No Exército, 78% dos 1.500 blindados estão indisponíveis e 80% deles têm mais de 30 anos de uso. Para piorar, dos 131 blindados Leopard, 70% estão fora de operação.

O Fuzil Automático Leve (FAL), usado pelos soldados em combate, já têm mais de 40 anos de uso e há sérias restrições quanto às munições.

Na Aeronáutica, a situação é igualmente grave. Dos 720 aviões da Força Aérea Brasileira (FAB), 63% está sem condições de voar. Apenas 267 aeronaves estão operacionais. Além disso, mais de 80% da frota tem mais de 15 anos de uso.

Com as compras de aviões russos pela Venezuela, a FAB caiu para a quarta posição entre as forças aéreas da América do Sul, atrás também de Chile e Peru.

A Venezuela comprou 24 aviões de caça Sukhoi Su-30 enquanto a FAb teve de contentar-se até o momento, com 12 Mirage 2000 usados, adquiridos da França (a maioria sequer foi entregue).

Já a Marinha está com metade dos seus navios parados, sem condições operacionais. Além disso, cinco submarinos convencionais precisam de reformas urgentes. De acordo com os relatos feitos no Congresso, é possível afirmar que a Marinha é a força em pior situação.

O Almirante Júlio Soares de Moura Neto explicou que desde 1999, foram desativados 22 navios e seis aeronaves. No mesmo período, apenas dez navios foram incorporados à força.

Moura Neto esclareceu que até meados de 2010, outros 17 navios deverão ser desativados, o que corresponde a 20% dos navios da Marinha. Até 2025, se o quadro for mantido, 87% das embarcações estarão indisponíveis e a Marinha pode parar.

No ano de 2003, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o primeiro mandato e cancelou o Programa FX, que previa a compra de aviões de caça modernos, o orçamento das Forças Armadas atingiu seu pior desempenho em 15 anos, com apenas R$ 4,3 bilhões.

Nelson Jobim quer marcar sua gestão como o ministro da Defesa que tirou do papel uma infinidade de boas intençoes. Para tanto, mudou a sistemática de elaboração do orçamento das Forças Armadas, que eram fechados pelos respectivos comandos.

Agora, as propostas são discutidas com o ministro, de acordo com a estratégia que está sendo definida pelo grupo interministerial criado por Lula em setembro e que conta com a participação dos ministros da Casa Civil, Fazenda, Planejamento e Ciência e Tecnologia.

Apesar do orçamento e do Plano Estratégico da Defesa ainda não terem sido fechados, sabe-se que o Exército teria priorizado a instalação de uma fábrica na Região Sul, destinada à recuperação de tanques, blindados e ao projeto de construção de radares tridimensionais, usados em baterias antiaéreas para orientar a mira dos canhões e metralhadoras.

A Marinha foca sua prioridade no projeto do submarino nuclear e na reforma de seus navios, enquanro a Aeronáutica, acredita que o projeto FX, dos caças supersônicos, em sua segunda versão, possa sair do paple. Além disso, pretende dispor de recursos para a compra de helicópteros e de jatos para o transporte de tropas.

O que ainda não está claro é o que o ministro Mangabeira Unger foi fazer na França e Índia e fará na Rússia. A princípio, essas viagens serviriam para conhecer como funcionam os respectivos ministérios da Defesa.

Por outro lado, motivados ou não pelas compras militares da Venezuela, os militares brasileiros parecem estar mais próximos do que nunca de um projeto de modernização que dê ao Brasil, Forças Armadas à altura de suas pretensões, reduzindo a dependência externa e privilegiando a soberania.

Marcelo Rech é jornalista, editor do InfoRel e especialista em Relações Internacionais e Estratégias e Políticas de Defesa. Correio eletrônico: inforel@inforel.org.

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